A busca pelas origens da astrologia frequentemente nos transporta para uma paisagem antiga, onde céu e terra pareciam conversar em uma linguagem hoje parcialmente redescoberta. Mergulhar na história da astrologia não é apenas revisitar datas e nomes, mas sim tatear as fundações de uma prática que moldou visões de mundo. Neste artigo, convidamos você a uma exploração pelas raízes mesopotâmicas do zodíaco, revelando como descobertas arqueológicas no atual Iraque iluminaram um ramo distinto e possivelmente mais antigo da tradição astrológica ocidental: a astrologia sideral. Qual a real origem dos signos que utilizamos e como essa compreensão altera nossa perspectiva?

Mas como essa sabedoria foi perdida? E por que seu resgate, graças à arqueologia e astrologia, está redefinindo nossa compreensão do cosmos?

Mergulharemos na história da astrologia, explorando como tábuas cuneiformes desenterradas no século XIX revelaram que a astrologia ocidental moderna tem raízes muito mais antigas — e muito mais estelares — do que se imaginava. Vou mostrar como os babilônios desenvolveram o zodíaco. Também mostrarei como a descoberta de antigas tábuas astronômicas e astrológicas no atual Iraque levou a conclusão que a astrologia praticada atualmente está longe das suas origens.

Astrologia Tropical vs. Sideral: O Que Você Precisa Saber

Antes de avançarmos, é essencial entender a diferença fundamental entre os dois sistemas astrológicos predominantes. Quais são as diferenças entre a Astrologia Védica e a Astrologia Ocidental (Astrologia Tropical):

  • Astrologia Tropical (a mais usada no Ocidente) baseia-se nas estações do ano, usando o equinócio vernal como ponto de referência. Ela está desconectada das constelações reais devido à precessão dos equinócios — um fenômeno que desloca lentamente o eixo terrestre.
  • Astrologia Sideral (a mais antiga) ancora-se nas estrelas fixas. Seu zodíaco mantém alinhamento com as constelações reais, preservando a visão celeste dos babilônios.

Para navegar por essa história, um ponto de partida essencial é compreender a diferença fundamental entre os dois principais sistemas zodiacais em uso: o tropical e o sideral. A Astrologia é um estudo fundamentado nos diferentes métodos para calcular a passagem do tempo e construir calendários. A astrologia tropical, amplamente difundida no Ocidente moderno, utiliza o equinócio vernal do hemisfério norte (o ponto de Áries) como marco zero. Seu zodíaco está, portanto, intrinsecamente ligado ao ciclo das estações terrestres – um ritmo que sentimos mudar ao longo do ano. Ele opera, em certo sentido, desconectado do fundo fixo das constelações que deram nome aos signos.

Voltando nosso olhar para a astrologia sideral, encontramos uma abordagem diferente para construir os seus calendários. Seu ponto de referência são as próprias estrelas fixas. O zodíaco sideral é definido pelas posições observáveis das constelações no céu. Essa perspectiva oferece uma sensação de ancoragem na imensidão estelar, desligada das variações sazonais. Existem duas grandes tradições siderais: a Astrologia Védica, com raízes no Vale do Indo, que se mantem viva até os dias de hoje, e a ocidental, que floresceu na Mesopotâmia – o “berço entre rios” Tigre e Eufrates, onde Babilônia e Assíria prosperaram milênios antes de Cristo. A geografia ainda ecoa: Bagdá relativamente próxima às ruínas de Babilônia, Mosul sobre a antiga Nínive.

O zodíaco sideral era preferido no mundo antigo porque as estrelas forneciam pontos fixos de referência, enquanto equinócios e solstícios são mais difíceis de medir e mudam com o tempo devido à precessão. O maior astrólogo tropical da Antiguidade tardia, Cláudio Ptolomeu, baseou-se em medições de equinócios que já eram aproximadas em sua época (século II d.C.). A precessão — a lenta mudança no eixo de rotação da Terra causada pelas forças gravitacionais do Sol, da Lua, de Júpiter e de Saturno — separa os cálculos tropical e sideral. Essa precessão axial tem um ciclo de aproximadamente 25.800 anos, fazendo com que os equinócios retrocedam pelo zodíaco ao longo dos milênios. Esse é o referencial teórico em torno da famosa “Era de Aquário” professada por diversos grupos esotéricos.

Arqueologia e Astrologia: O Tesouro Esquecido da Babilônia

Nossa investigação sobre a astrologia sideral ocidental nos conduz, inevitavelmente, à Mesopotâmia. Ali, durante séculos, observadores babilônicos registraram meticulosamente os movimentos celestes. Imagine a paciência e a dedicação necessárias para compilar dados sobre ciclos lunares e planetários, como os ciclos Saros (predição de eclipses) e Metônico (sincronização dos anos solar e lunar). Hoje temos esse conhecimento como certo, muitas pessoas não tem nem ideia da ciência ou porque nossos antepassados se interessaram em desvendar os segredos dos ciclos da natureza.

No século XIX, o arqueólogo britânico Austen Henry Layard escavou as ruínas de Nínive e Babilônia, desenterrando milhares de tábuas cuneiformes. Entre elas, estavam registros astronômicos detalhados — incluindo a Tábua de Vênus de Ammisaduqa (c. 1700 a.C.), que documentava ciclos planetários com impressionante exatidão.

Descobertas-chave, como a Tábua de Vênus de Ammisaduqa, marcaram o reconhecimento precoce da periodicidade celeste. O foco babilônico nos surgimentos e ocultações helíacos (primeira e última visibilidade de estrelas/planetas) e seu desenvolvimento da série de presságios Enuma Anu Enlil lançaram as bases para os sistemas zodiacais posteriores. Você deve estar se perguntando o que é surgimentos e ocultações helíacos. Surgimentos Heliacos são o aparecimento de estrelas no céu minutos antes do nascer do Sol. Durante o ano, as estrelas que surgem no horizonte antes do nascer do ano mudam e dessa maneira sabemos que o Sol está se movendo contra o firmamento.

Por volta do século VII a.C., os astrônomos babilônios haviam refinado os ciclos lunares e planetários, incluindo o ciclo saros (usado para prever eclipses) e o ciclo metônico (relacionando anos lunares e solares). Sua ênfase na eclíptica (o caminho aparente do Sol) em detrimento do equador celeste distinguiu seu sistema.

As tábuas cuneiformes desenterradas por arqueólogos são testemunhas silenciosas dessa era – a arqueologia e astrologia se encontram nesses artefatos. A vasta coleção de presságios Enuma Anu Enlil revelam um sistema onde os céus eram lidos em busca de sinais relevantes, primariamente para o destino do reino e de seu governante.

É importante notar que o zodíaco de 12 signos iguais não surgiu instantaneamente. Foi um desenvolvimento gradual, provavelmente substituindo sistemas anteriores baseados em mais constelações de tamanhos desiguais. Por volta de 500 a.C., os babilônios haviam padronizado um sistema de 12 signos de 30 graus cada, alinhados com estrelas fixas específicas. Essa estrutura, por ser baseada em referências estelares, não era afetada pelo lento fenômeno da precessão dos equinócios – o gradual deslocamento do eixo terrestre que faz com que o ponto vernal retroceda através das constelações ao longo de milênios. Essa estabilidade era, sem dúvida, um fator atraente.

Astrologia Sideral a Serviço do Estado

Todo o esquema foi construído com observações muito extensas ao longo de muitos séculos, especialmente dados que sustentam relações periódicas — ou seja, que se repetem regularmente — e as relações matemáticas que as unem.

Como o primeiro horóscopo babilônico encontrado até hoje, que era para um indivíduo comum não real, data apenas entre 600 a.C e 410 a.C., não se sabe quanto tempo antes a astrologia tornou-se operacional em sua forma atual. No entanto, o que é explicitamente afirmado pelos estudiosos dos últimos 100 anos que examinaram os dados primários é que a astrologia babilônica clássica era reservada exclusivamente para o rei e para assuntos de Estado. Portanto, não é surpresa que nenhum horóscopo anterior tenha sido encontrado. Pode não haver nenhum para indivíduos não reais antes do século V a.C.

No entanto, a astrologia certamente era usada, por exemplo, na corte de Marduk-Nadin-Ahhe, que governou a Babilônia de 1099 a 1082 a.C. A questão central é sua forma e nível de sofisticação. Todos os estudiosos enfatizam que a astrologia não surgiu totalmente formada. Ou seja, a astrologia é muito mais antiga que o período de 410 a.C., quando ocorreu a transição de 18 constelações desiguais para 12 signos siderais igualmente espaçados. Sim! Haviam 18 Signos/Constelações antes dos nossos 12 signos.

O momento exato dessa transição é difícil de determinar, provavelmente porque ambas as tradições coexistiram por um tempo desconhecido. O assunto é debatido em círculos acadêmicos. Alguns acadêmicos modernos afirmam que o zodíaco não tem mais de 500 a.C. Contra isso, um exemplo datável é a Crônica de Esarhaddon, que precede o horóscopo de 410 a.C. em mais de dois séculos e meio. Isso constitui prova textual persuasiva de que o zodíaco de 12 divisões iguais já estava estabelecido muito antes do início do século V a.C.

A Babilônia foi conquistada e arrasada por Senaqueribe, rei da Assíria, no início do século VII a.C. A guerra entre os dois estados foi endêmica ao longo de sua história. Senaqueribe foi assassinado por seus filhos em 681 a.C., que desejavam o trono para si. Um dos filhos, o príncipe herdeiro Esarhaddon, não estava envolvido no complô e imediatamente pegou em armas contra seus irmãos, iniciando uma guerra civil que Esarhaddon venceu no final de 680 a.C.

Esarhaddon foi rei da Assíria de 680 a.C. a 669 a.C. Dizem que ele desenvolveu um papel importante na divulgação e o uso da astrologia na época. Seu pai teria sido morto graças a uma conspiração que teria raizes na retenção de previsões de seus astrólogos babilônicos. O Rei então pede que os textos reservados nos templos fossem copiados e ensinados a servidores assírios, para que ele pudesse se consultar com astrólogos de confiança. Ele foi sucedido por seu filho mais famoso, Assurbanipal, da ilustre primeira biblioteca da história. Para contextualizar a época, a Crônica de Esarhaddon menciona o surgimento helíaco de Júpiter em junho de 680 a.C. Mas, mais importante, é um dos primeiros textos a mencionar o ashar nerti, mais conhecido como exaltações ou lugares ocultos, chamados hypsomata pelos gregos.

Júpiter ou Marduk, o Deus da Babilônia

Na Crônica de Esarhaddon está a seguinte declaração:

No mês de Simanu (ou seja, junho de 680 a.C.), Júpiter brilhante, que toma decisões por Acade, aproximou-se do lugar onde o Sol ilumina e ali permaneceu brilhando. Seu surgimento foi perfeito como o nascer do Sol. Os deuses irados reconciliaram-se com a terra de Acade. Houve chuva abundante e inundações regulares na terra de Acade. Ele (ou seja, Júpiter) então dobrou seu curso, e no mês de Tishri (que é outubro de 680 a.C.), atingiu seu ashar nerti (ou seja, sua exaltação, que é seu hypsomata) e permaneceu em sua casa.

https://www.britishmuseum.org/collection/image/110221001

A primeira parte dessa declaração refere-se a Ascenção helíaca de Júpiter em junho, que foi um evento importante para o Estado babilônico. Pode-se ver que, em termos do cálculo babilônico, em 26 de outubro de 680 a.C., no dia em que Júpiter tornou-se retrógrado, ele estacionou a 14°36′ de Câncer — a menos de meio grau de seu grau de exaltação preciso, que é 15° de Câncer 0′.

A versão tropical disso com Júpiter logo dentro de Câncer tropical. Há a representação tropical de Júpiter em seu estacionamento direto a 22° de Gêmeos, tendo retrogradado para fora de sua casa, o que mostra que o texto não poderia ser tropical. Observe isso por um momento: pode-se ver que Júpiter estava bem dentro de Gêmeos tropical.

Isso é importante por quatro razões:

  1. O texto da Crônica de Esarhaddon só descreve o que aconteceu se o zodíaco de 12 divisões iguais já estivesse em vigor em 680 a.C.
  2. Sugere fortemente que as localizações das exaltações já eram uma tradição nessa data.
  3. Mostra que os babilônios consideravam que um planeta que retrogradava para fora de seu signo durante seu arco retrógrado era claramente um mau presságio.
  4. Esses eventos não poderiam ser tropicais.

A razão pela qual a posição de Júpiter era tão importante para Esarhaddon que levaria o registro dessa tabua de argila, deveu-se à guerra civil que assolava a Assíria desde a morte de seu pai, Senaqueribe que falamos anteriormente. Júpiter em sua exaltação — porque a astrologia era apenas para o rei — significava que o governante legítimo prevaleceria, o que de fato aconteceu.

O Declínio no Ocidente e a Redescoberta Moderna

A astrologia sideral floresceu na Mesopotâmia, especialmente na segunda metade do primeiro milênio a.C., com efemérides cada vez mais precisas. Contudo, com o declínio de Babilônia – talvez por secas prolongadas, talvez pela mudança da capital por Seleuco após Alexandre – e a subsequente ascensão de Roma e da influência grega, essa tradição perdeu força no Ocidente. A última tábua cuneiforme conhecida data de 75 d.C. Embora a astrologia sideral tenha sobrevivido robustamente na Índia, ela praticamente desapareceu do Oriente Próximo e da Europa.

O conhecimento adormeceu por séculos. A chave para sua redescoberta veio com a arqueologia e astrologia no século XIX. As escavações de Austen Henry Layard em Nínive e Babilônia trouxeram para a Europa uma vasta quantidade de artefatos, incluindo mais de 100.000 tábuas cuneiformes hoje no British Museum. A decifração desses textos, a partir da década de 1870, revelou a complexidade da astronomia e astrologia babilônicas.

Foi nesse contexto que Cyril Fagan, um astrólogo irlandês do século XX, desempenhou um papel crucial. Imerso nos trabalhos acadêmicos que traduziam e interpretavam as tábuas (publicados por assiriólogos como Epping, Strassmaier, Kugler e Schaumberger), Fagan percebeu, em 1944, que a astrologia praticada no mundo antigo, antes da forte influência helenística, era predominantemente sideral. Ele argumentou que seu declínio no Ocidente não se deveu a uma suposta inferioridade, mas a uma combinação de fatores históricos:

  1. A coincidência fortuita dos zodíacos tropical e sideral por volta do século III d.C. (um evento que ocorre apenas a cada ~25.800 anos devido à precessão).
  2. A subsequente “Idade das Trevas” na Europa Ocidental, que levou à perda de conhecimento sofisticado.
  3. A perda da capacidade de ler o acádio, a língua das tábuas babilônicas.

Quando o interesse pela astrologia ressurgiu na Europa séculos depois, foi a versão tropical, a última utilizada pelos gregos antes do declínio, que foi retomada. A história havia sido reescrita ao ponto que hoje a maioria dos astrólogos desconhece como a astrologia era praticada na antiguidade. A interpretação, o que costumava ser interpretado e o que os astrólogos da antiguidade eram capazes de prever com o que sabiam.

Conclusão: Por Que Voltar às Origens?

história da astrologia não é apenas uma curiosidade acadêmica — é um convite a reconectar-se com um conhecimento que transcende o tempo. A arqueologia e a astrologia provaram que os babilônios eram mestres da observação celeste, e seu legado ainda tem lições a nos oferecer. Estudar astrologia sideral tendo uma experiencia anterior na astrologia ocidental é uma oportunidade de se aprofundar em uma nova maneira de ver e interpretar o mundo. Se o céu que vemos hoje é o mesmo que inspirou civilizações antigas, será que estamos realmente “avançando” — ou apenas redescobrindo o que já foi sabido?