Tabela de Conteúdo
Introdução
Neste post passado vimos a datação do primeiro mapa astral foi em 410 a.C e a provável datação do texto babilônio, o Enuma Anu Enlil, sendo escrito entre 1500–1157 a.C. Mas qual seria a datação de mais antiga na Índia? para entender e datar os textos mais antigos de astrologia védica precisamos entender das diferentes fazes da civilização védica e usar técnicas de arqueoastronomia.
Entre todos os textos e escrituras, destacam-se antes de tudo os próprios Vedas que já continham dicas sobre posições celestes, mas como o texto mais antigo de astronomia o Vedanga Jyotisha tem a sua posição de destaque. Este texto é datado aproximadamente entre 1500 a.C. e 1200 a.C. sendo os marcos iniciais da busca milenar pelo conhecimento astrológico e astronômico na Índia.
O que é Arqueoastronomia?
Arqueoastronomia é o estudo da astronomia praticada por povos pré-históricos, por meio dos seus monumentos construídos pela observação dos astros e da relação entre o homem da antiguidade com eventos celestes importantes, como equinócios, solstícios, helíacos, eclipses e passagens de planetas. É uma ciência que busca compreender como os fenômenos astronômicos influenciavam o cotidiano dessas sociedades e o papel que o céu desempenhava em suas culturas
Essa disciplina multidisciplinar utiliza métodos e técnicas da arqueologia, astronomia, antropologia e história para investigar e interpretar as evidências deixadas pelos povos antigos em relação à astronomia. Alguns exemplos de monumentos e artefatos estudados pela arqueoastronomia incluem Stonehenge, as pirâmides do Egito e o mecanismo de Anticítera.
Arqueoastronomia na Índia: Quem foi Maharishi Lagadha
Maharishi Lagadha é tido como a mente por trás do Vedanga Jyotisha. Lagadha elogia a astronomia como a disciplina principal entre os Vedangas. Para quem desconhece os Vedangas são os textos auxiliares necessários para entender os Vedas, as escrituras religiosas imortais da Índia. Lagadha é conhecido como um dos primeiros matemáticos e astrônomos indianos, e é reverenciado como um grande Maharishi, muitas vezes chamado de Lagadh Muni, e suas contribuições para a astronomia são relevantes até hoje.
O Vedanga Jyotisha, é um texto fundamental para a Jyotisha, uma das seis disciplinas do Vedanga. Para compreender o seu papel de destaque é preciso entender que 4 destes Vedangas são manuais para entender o Sânscrito, o quinto Vedanga trata sobre rituais e cerimonias e o ultimo, Vedanga Jyotisha, apenas sobre astronomia. O texto desempenha um papel crucial na compreensão da cosmovisão védica e cumpre o papel de ponte entre o mundo material e conceitos metafísicos do pensamento indiano.
Lagadha também é conhecido por definir o Muhurta, uma unidade de medida de tempo que ele descreveu como o equivalente a um recipiente que contém 50 palas de água em um relógio d’água.
Arqueoastronomia na Índia: O que foi o Período Védico?
Ainda não falamos sobre o que foi o Período Védico e a sua influencia. Para entender a posição dentro da linha do tempo, precisamos rever as definições do Período Védico como é ensinado nos livros de história.
O período védico é um capítulo de extrema relevância, abrangendo o intervalo entre 1500 a.C. e 600 a.C, Ele marca o fim da Idade do Bronze e o início da Idade do Ferro na história da Índia. Durante esse tempo, a literatura védica, incluindo os Vedas (c. 1500-900 a.C.), foi composta no norte do subcontinente indiano, entre o declínio da Civilização Haraparam e uma segunda urbanização, que teve início na Planície Indo-Gangética central.
Os Vedas são escrituras religiosas que fundamentaram a filosofia védica, que se desenvolveu no Reino dos Kurus, uma união tribal de diversas tribos indo-arianas. Esses textos contêm detalhes sobre a vida desse período, sendo as principais fontes para compreender essa época. Em conjunto com o registro arqueológico e da arqueoastronomia permitem traçar e inferir a evolução da cultura indo-ariana e védica.
Por volta de 1200-1000 a.C., a cultura védica se espalhou para leste, até a fértil Planície do Ganges Ocidental. A segunda metade do Período Védico foi marcada pelo surgimento de cidades, reinos e uma complexa diferenciação social, assim como pela codificação do ritual sacrificial ortodoxo pelo Reino dos Kurus. O fim do Período Védico testemunhou o surgimento de cidades e estados (chamados de mahajanapadas), bem como movimentos śramaṇa (incluindo o Jainismo e o Budismo), que desafiaram a ortodoxia védica.
Arqueoastronomia na Índia: Datando o Período Védico
Agora que compreendemos alguns elementos da civilização védica, podemos confirmar as datas por meio de sua expressão cultural e seu contexto temporal. Embora a tradição védica tenha sido principalmente transmitida oralmente, seus hinos contêm versos-chave sobre eventos celestes, usados para marcar momentos precisos de início de cerimônias.
Pesquisadores contemporâneos se empenharam em estabelecer a datação do período védico por meio de análises da arqueoastronomia. No século XVIII, Sir William Jones, um orientalista inglês, buscou demonstrar, com base em informações coletadas pelo astrólogo medieval Varaha Mihira, que o eminente sábio Parashara teria vivido por volta de 1181 a.C observando dados de fenômenos celestes.
Hermann Jacobi, um estudioso no assunto, argumentou que nos Rigveda e Atharvaveda, o sol estava posicionado no nakshatra Purva Phalguni durante o solstício de verão. Já em outros textos, o Sankhayana e Gobhila Grhya Sutra, manuais sobre cerimônias védicas, a Lua Cheia ocorria no nakshatra oposto, Bhadrapada, marcando o solstício de verão repetindo o que o Rigveda afirmava. Se alinharmos os cálculos para confirmar essas posições, tais eventos teriam ocorrido entre 4500-2500 a.C. muito além das datações acadêmicas mais modestas.
Arqueoastronomia na Índia: Outros marcos do Vedanga Jyotish
A datação do Vedanga Jyotisha é relevante para determinar a datação dos textos védicos. O Vedanga Jyotisha descreve como um sacerdote deveria prever a chegada do solstício de inverno. Se usarmos os fatores descritos chegariamos ao período de aproximadamente 1400 a.C. Essa descrição tem sido usada para datar o próprio Vedanga Jyotisha. A maioria dos estudiosos chega a conclusão que se observarmos os eventos celestes a datação pode ter apenas uma diferença de 200 anos.
Outros autores propõem uma composição mais tardia. Santanu Chakraverti escreve que ele foi composto após 700 a.C., enquanto Michael Witzel o data para os últimos séculos a.C., com base apenas no estilo de composição e como ele foi escrito. De acordo com Chakraverti, sua descrição do solstício de inverno está correta para cerca de 1400 a.C., mas não para o momento de sua composição após 700 a.C. Isso pode ser devido à incorporação do conhecimento astronômico do império Haraparam tardio no contexto védico, uma ideia também proposta por outros estudiosos.
Arqueoastronomia na Índia: A Estrela Polar e a Precessão dos Equinócios
Não havia nem inexistência nem existência então; Nem o reino do espaço, nem o céu que está além; O que se agitou? Onde? Sob a proteção de quem? Não havia nem morte nem imortalidade então; Nenhum sinal distintivo da noite nem do dia; Aquele Único respirava, sem vento, por seu próprio impulso; Além disso, não havia nada mais. Escuridão havia no princípio, oculta pela escuridão; Sem marcas distintivas, tudo isso era água; Aquilo que, ao tornar-se, foi coberto pelo vazio; Aquele Único, pela força do calor, veio à existência; Quem realmente sabe? Quem proclamará isso aqui? De onde foi produzido? De onde é esta criação? Deuses vieram depois, com a criação deste universo. Quem então sabe de onde isso surgiu? Se a vontade de Deus o criou, ou se Ele ficou em silêncio; Talvez ele mesmo tenha se formado, ou talvez não; O Supremo Brahman do mundo, todo-pervasivo e todo-sabedor Ele de fato sabe, se não, ninguém sabe. — Rigveda 10.129
A menção ao “Aquele Único”, presente no hino acima e em diversas outras passagens, tem sido tamem interpretada por muitos como um símbolo que remete ao próprio eixo do mundo, o eixo que de rotação terrestre. É um consenso que a Estrela Polar, na sua posição fixa e imutável, carrega consigo uma simbologia divina profundamente enraizado nas antigas crenças da humanidade, sendo referenciada em diversos pontos do globo com muito respeito por povos antigos. Ao observar o universo tangível em referencia a Estrela Polar, fica claro que o firmamento dança ao redor daquele ponto luminoso que permanece majestosamente inabalável.
Em outras passagens, essa entidade é designada como “Aquele que mora além dos sete sábios”, isso se dá como referencia até os dias de hoje como uma metáfora para encontrar a Estrela Polar nos céus. Quando nos debruçamos sobre os cálculos levando em consideração o movimento da precessão dos equinócios, percebemos outras referencias sendo comunicadas. Esses cálculos, conduzem nosso olhar em direção à estrela polar Thuban (α Draconis), que um dia desempenhou o papel central como a Estrela Polar.
Atualmente, a estrela Thuban já não desfruta da mesma posição. O fenômeno da precessão dos equinócios e o sutil deslocamento do eixo de rotação terrestre ao longo do tempo foram responsáveis por reposicionar seu ponto no céu. Hoje, é a estrela Polaris que assume esse papel de destaque. Na Índia, ela é também conhecida como “Druva”, um termo que carrega significados e tem o próprio simbolismo astrológico e mítico.
Arqueoastronomia na Índia: Conteúdo Bonus
O vídeo na sequencia é um estudo sobre fatos em torno do tema que abordamos acima. Se você tem interesse neste assunto é uma boa referencia e trás mais fatores a serem contemplados.
Conclusão
A busca pela datação dos textos mais antigos, como o Vedanga Jyotisha, nos conduz por um caminho que mescla elementos da arqueoastronomia e referências mitológicas. A figura de Maharishi Lagadha emerge como responsável por conectar a cosmovisão védica com as estrelas. Através da intersecção entre o conhecimento científico e a observação celeste podemos datar e verificar por exemplo que as descobertas astronômicas védicas não seguiram a construção de conhecimento que acontecia na babilônia, mas acontecia provavelmente em paralelo.
No todo, a busca por datar o Período Védico e seus textos primordiais nos proporciona uma janela questionamentos a respeito de declarações a respeito da origem e difusão do conhecimento astrologico. Através de investigações da arqueoastronomia, análises textuais e correlações com a história, podemos traçar um mapa do conhecimento que floresceu nesse período.
Quer aprender um pouco mais sobre astrologia védica? Dê uma olhada na nossa apostila gratuita.
FAQ
O que é Arqueoastronomia?
Arqueoastronomia é o estudo da astronomia praticada por povos pré-históricos, por meio dos seus monumentos construídos pela observação dos astros e da relação entre o homem da antiguidade com eventos celestes importantes, como equinócios, solstícios, helíacos, eclipses e passagens de planetas.
Como é definido o Período Védico e sua influência?
O Período Védico (1500 a.C. – 600 a.C.) marcou o fim da Idade do Bronze e o início da Idade do Ferro na Índia. Durante esse período, a literatura védica, incluindo os Vedas, foi composta e influenciou a cultura e o pensamento indiano.
Qual a data de inicio do Período Védico?
Pesquisadores usam análises da arqueoastronomia para ajudar a datar o Período Védico. Com base em dados celestes nos textos védicos, algumas estimativas sugerem datas entre 4500-2500 a.C. embora estimativas mais conservadoras indiquem entre 1500 a.C. e 600 a.C
Qual é a importância da Estrela Polar na arqueoastronomia?
A Estrela Polar desempenha um papel simbólico profundo em várias culturas antigas. Seu deslocamento devido à precessão dos equinócios é considerado um símbolo de mudança.
Quem foi Maharishi Lagadha e sua contribuição?
Maharishi Lagadha, associado ao Vedanga Jyotisha, foi um dos primeiros matemáticos e astrônomos indianos. Suas contribuições para a astronomia são relevantes até hoje.
Quando foi datado o primeiro mapa astral e o Enuma Anu Enlil?
O primeiro mapa astral data de 410 a.C. e o texto babilônio Enuma Anu Enlil foi escrito entre 1500–1157 a.C.